sexta-feira, 30 de abril de 2010

Vidas que se cruzam

A história é um prato cheio para análise de um especialista comportamental. Mariana/ Sylvia é uma personagem densa e suas camadas vão se evidenciando ao longo da narrativa. Da mesma forma, Gina, sua mãe, também tem um passado marcado por dramas e lutas. No amor fora do casamento, encontra uma razão para viver e purgar seu sofrimento. Nessa trama criada em formato de mosaicos, Charlize Theron (filha) se entrega à personagem, ao passo que Kim Bassinger (mãe) passa meio blasé pelos acontecimentos.


O filme postula ao fogo a responsabilidade de gravar nos personagens marcas que levarão para sempre consigo, na vida e na morte. Aliás, o início e o limiar da existência estão sempre diante das pessoas ao longo das cenas. Há sempre algo a esquecer, a perdoar, a superar. A retomada da vontade de viver está subordinada a um choque brusco. Invariavelmente.

Esse estilo, consagrado por Guillermo Arriaga nos filmes em que atuou exclusivamente como roteirista (aqui ele assina o roteiro e, pela primeira vez, a direção), como Babel e 21 Gramas, mais uma vez é executado com precisão. Os recortes impostos às cenas não confundem o espectador. Ao contrário, o instiga a descortinar as vidas ali retratadas. Sensível e envolvente!

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Atraídos pelo crime

Não sou muito afeita a filmes de ação. Mas admiro aqueles que conseguem trazer ao espectador sequencias bem cortadas, daquele tipo que é impossível piscar os olhos sem perder algum momento crucial. "Atraídos pelo crime" não consegue apresentar um ritmo interessante. É arrastado, os dilemas dos protagonistas são repetidos a todo momento, e os diálogos são pra lá de batidos. Há uma cena entre Don Cheadle e Wesley Snipes, em que o primeiro dispara algo assim: ao sumir, você se torna um fantasma, mas também uma lenda. Muito solene para dois chefes do tráfico do Brooklyn...

O filme poderia se passar nos anos 70 ou nos dias que correm. Ele não tem frescor, não traz nenhum novo ângulo ao espectador. Não recomendo, apesar de destacar a interpretação de Ethan Hawke (foto), que para mim sempre realiza um trabalho de entrega total aos seus personagens. Richard Gere está o canastrão de sempre!

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Abraços Partidos

Ontem assisti Abraços Partidos, do meu diretor favorito, Pedro Almodóvar. Demorei a vê-lo, como se o guardasse para um dia propício, como uma roupa especial ou aquele pedacinho da torta favorita. Pode parecer uma comparação infame ou fútil, mas tenho a intuição de que o momento foi oportuno.

Eu não consigo escrever sobre qualquer obra dele de forma imparcial, uma vez que sou completamente apaixonada por seus filmes, especialmente pela trinca Tudo sobre Minha Mãe, Fale com Ela e Carne Trêmula. Mas, o assunto aqui é a história de amor de Lena (Penélope Cruz) e Mateo Blanco/Harry Caine (Lluis Homar), que, como todo melodrama de Almodóvar que se preze, envolve polêmica, passionalidade e uma pitada de tragédia. Li várias críticas apontando que o diretor flerta com o noir e com o suspense a la Hitchcock, mas sua marca ainda é a escola difundida por Fassbinder.

Em Abraços, Lena, moça humilde, começa a se relacionar com um ricaço, após ter trabalhado como secretária e garota de programa, além de ser atriz aspirante. O destino dela se cruza com o de Mateo Blanco, diretor de cinema acostumado a produzir dramas, durante a seleção de elenco para seu primeiro filme de comédia. Esse encontro movimenta a vida de vários personagens, afetando-os para sempre. Nesse rol, estão o marido de Lena e seu filho, e a agente Judit (Blanca Portillo) e Diego (Tamar Novas), o ouvinte da narrativa contada por Mateo/ Harry. A força motriz da história, porém, advém de um acidente de carro que tira a vida de Lena e a visão de Mateo/ Harry. Após a tragédia, Mateo, o diretor, é enterrado com Lena, e Harry Caine, o escritor, brota das profundezas do homem desiludido.

A fotografia construída em tons fortes, a homenagem ao cinema a aos cineastas em referências ao longo do filme e os absurdos que somente fazem sentido pelas mãos de Almodóvar são mesclados e convertidos em um produto emocionante, alinhado à essência e trajetória do diretor espanhol mais aclamado dos últimos tempos.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Avatar: epifania visual


Meu objetivo com esse post não é relatar, mais uma vez, a evolução tecnológica alcançada pelo diretor James Cameron com o projeto Avatar, que culminou em um filme marcante na história do cinema mundial. Minha visão é puramente sensitiva, de espectadora. Fiquei enlouquecida com as cores, as idéias empregadas na concepção da fauna e da flora do planeta Pandora e com a descrição do relacionamento dos Na’vis com o seu habitat.

A experiência sensorial, em 3-D, remete a um mundo em que os seres têm uma ligação umbilical com o meio em que vivem e a “mãe natureza” promove o equilíbrio de todos os elementos presentes em seu ecossistema. A pesquisa e o desenvolvimento de recursos tecnológicos transformaram-se em uma obra homogênea. Tudo flui com muita naturalidade no mundo fantástico de Pandora. Parece até um paradoxo, mas quem viu o filme me entenderá. É uma epifania visual.

Com esse investimento maciço na criação de um meio ambiente alienígena repleto de criaturas encantadoras e relevo exótico, a performance dos atores acaba se diluindo na obra. Eles são os coadjuvantes do espetáculo. Não conseguimos prestar muita atenção aos detalhes das expressões e maneirismos dos atores, na forma humana ou como avatares.

A longa espera pela oportunidade de assistir ao filme valeu a pena. Além da inovação tecnológica, Avatar desperta a consciência do público para as questões ecológicas e deixa uma mensagem clara: destruir a natureza em nome da ganância é decretar o fim da humanidade!