sexta-feira, 20 de março de 2009

As Horas

O filme é brilhante pelas atuações impecáveis do trio de protagonistas e pelos textos que se alternam em frases sutis e cortantes, que descrevem as vidas "desdobradas em um só dia".

Acho interessante um momento do filme em que Mrs. Dalloway é descrita como uma mulher auto-confiante e que por isso ninguém suspeita da angústia que se passa dentro dela. Essa diretriz é seguida por todas as mulheres que sofrem em silêncio.

Virgínia Woolf (Nicole Kidman) senta-se com a irmã e os sobrinhos para uma "conversa" afável na sala de visitas. Todos tagarelam, os sobrinhos se entediam com a falta de atividade física e brincadeiras intrínsecas ao mundo infantil, enquanto Virgínia divaga em seu mundo. A irmã define muito bem seu estado. "Virgínia é uma privilegiada. Ela vive em dois mundos: o real e aquele em que ela cria em seus livros".

Não que a escritora fosse feliz, mas ela tentava se adaptar à vida que não era dela, e enquanto isso produzia sua obra para tentar escapar dos "assuntos triviais" e do cenário bucólico do subúrbio.

A cena em que o marido a impede de ir a Londres sintetiza o dilema que a consumiu por toda da vida. Ela fala que não há como ser pleno se escondendo da vida. Em seu caso específico, o subúrbio não lhe trouxe paz. A paz não existia em seu interior.

Laura (Julianne Moore) tem várias passagens memoráveis, mas o momento em que se despede da vizinha que se submeteria a uma cirurgia grave também reforça esse conceito do "que pareço" em contraponto "ao que sinto". A interlocutora de Moore conta a situação como se fosse algo trivial; no momento seguinte entrega-se à tristeza e revela suas aflições; e finaliza a despedida com a velha máscara da segurança.

Laura ainda passa por momentos cruciais, como o desespero do pequeno Richard quando se dirige ao hotel, a tentativa do suicídio - incluindo o sonho da água invadiando o quarto - e a espera do marido por ela na cama para mais uma noite enfadonha. Entre morrer - levar adiante a vida que não era sua ou pôr fim à existência física - e viver, ela escolheu a segunda opção, sem pensar em mais nnguém.

Clarissa (Meryl Streep) se relaciona com o mundo e com as pessoas caras - a filha e a companheira - sempre fazendo alusão ao verão perfeito que viveu ao lado de Richard quanto tinha 18 anos. O momento em que ela revê o ex-affair do poeta na cozinha funciona como um Big Bang. As emoções jorram com força total, enquanto ela exprime a decepção de ter perdido o amor da juventude, de ter cuidado dele enquanto o ex vagava pelo mundo e o impacto daquele reencontro.

Não eram as heroínas Laura e Clarissa que deveriam morrer, mas o visionário. Elas escolheram a vida e reagiram com as ferramentas que tinham. Apenas a mente que criou Mrs. Dalloway não suportou viver perdida entre duas realidades. Optou pelo "fim".

Sinopse

Em três períodos diferentes vivem três mulheres ligadas ao livro "Mrs. Dalloway". Em 1923 vive Virginia Woolf (Nicole Kidman), autora do livro, que enfrenta uma crise de depressão e idéias de suicídio. Em 1949 vive Laura Brown (Julianne Moore), uma dona de casa grávida que mora em Los Angeles, planeja uma festa de aniversário para o marido e não consegue parar de ler o livro. Nos dias atuais vive Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora de livros que vive em Nova York e dá uma festa para Richard (Ed Harris), escritor que fora seu amante no passado e hoje está com Aids e morrendo.

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